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Empregados concursados de estatais podem ser dispensados sem justa causa?

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Nova tese definida pelo STF trará bastante impacto para as empresas públicas e sociedades de economia mista

Em julgamento polêmico, o STF decidiu, por maioria, que a dispensa de empregados de empresas públicas e sociedades de economia mista que tenham sido admitidos mediante concurso público não será válida sem a devida motivação prévia. A tese foi fixada no último dia 28 de fevereiro e gerará efeitos apenas a partir de sua publicação.

A discussão aberta gerou o Tema 1022 da Repercussão Geral adotando o seguinte entendimento: “As empresas públicas e as sociedades de economista mista, sejam elas prestadoras de serviço público ou exploradoras de atividade econômica, ainda que em regime concorrencial, têm o dever jurídico de motivar em ato formal a demissão de seus empregados concursados, não se exigindo processo administrativo. Tal motivação deve consistir em fundamento razoável, não se exigindo, porém, que se enquadre nas hipóteses de justa causa da legislação trabalhista”.

O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, defendeu o entendimento, corroborado por Nunes Marques e Gilmar Mendes, de que as empresas públicas e sociedades de economia mista, por estarem equiparadas por lei às empresas da iniciativa privada, também não necessitariam motivar seus desligamentos. Por lei, as empresas privadas exercem livremente o direito de dispensar empregados sem justa causa, apenas arcando com as indenizações previstas em lei.

A corrente apoiada por Moraes trazia, como principal argumento, a ideia de que tornar obrigatória a motivação de qualquer dispensa constitui um ônus às empresas públicas e às sociedades de economia mista, por dificultar o desligamento de empregados ineficientes, prejudicando, consequentemente, os seus resultados e tornando-as menos competitivas com relação ao mercado, de forma geral.

Por sua vez, o ministro Edson Fachin não dispensava a instauração de processo administrativo para apuração dos fatos que levaram ao desligamento, enquanto o ministro André Mendonça não apenas acompanhava a divergência, como ainda provia o recurso do empregado para anular a dispensa, imprimindo efeito retroativo ao entendimento consolidado pela Suprema Corte.

A tese vencedora, apoiando a divergência lançada pelo ministro Luís Roberto Barroso, ficou no meio termo, considerando ser um direito do empregado concursado receber a comunicação formal dos motivos que levaram ao seu desligamento, e acrescentando que tal decisão deverá conter fundamento “razoável”.

Não há dúvidas de que a nova tese trará bastante impacto para as empresas públicas e sociedades de economia mista de uma forma geral. Isso porque, ainda que o Supremo tenha concluído pelo afastamento do direito à estabilidade, permitindo expressamente o desligamento dos empregados que ingressaram na carreira através de concurso público mesmo sem a prática de uma falta grave, a tese fixada demandará uma revisão dos processos internos das empresas, adicionando essa etapa formal, já que, no mínimo, a motivação deverá ser discutida, formalizada e informada ao empregado.

No entanto, o principal ponto de atenção aqui diz respeito justamente aos fundamentos dessa motivação, considerando que o conceito de “fundamento razoável” utilizado na tese fixada é bastante vago e deixa margem para diferentes interpretações.

A subjetividade do conceito de razoabilidade, aliás, surgiu como um ponto de preocupação durante a definição da tese, desencadeando inclusive um debate entre os ministros no julgamento. Barroso sustentou, contudo, que caberá ao Judiciário, em cada caso, analisar se a motivação apresentada se reveste ou não de razoabilidade, destacando que “no caso de empregado de sociedade de economia mista empresa e de pública concursado, a demissão em nome do princípio da impessoalidade também deveria ser motivada. No entanto, esse ônus tem contornos bastante limitados, não se exige que a razão apresentada se enquadre em alguma das hipóteses previstas na legislação trabalhista como justa causa. O que se demanda é apenas a indicação por escrito dos motivos da dispensa, sem a necessidade de processo administrativo”.

Se por um lado a decisão traz para as empresas o conforto em definir a possibilidade de desligamento destes empregados sem a necessidade de um procedimento administrativo, por outro, peca ao incluir na tese conceito eivado de extrema subjetividade e que, como antecipado pelo próprio ministro Barroso, será definido, na prática, por cada juiz. A expectativa passa a ser então que continue chegando à Justiça do Trabalho uma enorme quantidade de casos, desta vez questionando a “razoabilidade” dos motivos apresentados pelas empresas públicas e sociedades de economia mista ao dispensar seus empregados concursados. Sofre, uma vez mais, a segurança jurídica.

De toda forma, uma coisa é certa: as empresas impactadas deverão estar atentas e dedicar um extremo cuidado aos motivos que serão utilizados para justificar o término da relação de emprego, além de guardar evidências que comprovem os motivos dos desligamentos, especialmente se quiserem evitar possíveis alegações de dispensas discriminatórias.

Fonte JOTA

FERNANDA NASCIUTTI – Sócia da área Trabalhista do BMA Advogados
JOSÉ LUIZ CARDOSO – Advogado da área Trabalhista do BMA Advogados

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