Companhia diz que transporte do combustível não foi feito com a estrutura da empresa, por isso, a responsabilidade é de terceiros.
A Vibra Energia, que antes de ser privatizada se chamava BR Distribuidora, pode perder a autorização para revenda varejista por reincidir na distribuição de combustíveis fora das especificações exigidas pela ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis).
A última decisão da área técnica da agência sobre esse assunto, que saiu no fim de setembro, negou recurso apresentado pela empresa e ratificou a penalidade imposta à distribuidora de combustíveis em agosto.
Em março de 2022 uma fiscalização da ANP fez coleta de uma carga de etanol hidratado comum comercializado pela Vibra e transportado em Minas Gerais por um terceiro, a partir da base da empresa em Betim (MG).
Um relatório emitido três meses depois, em junho daquele ano, atestou que o combustível estava com pH (Potencial Hidrogeniônico) 5.2, abaixo da especificação da ANP, que exige pH entre 6.0 a 8.0, com tolerância de 5.6 a 8.4.
Uma contraprova da análise foi emitida em setembro e atestou que o resultado na verdade era ainda mais distante do exigido, com pH de 4.8.
Com isso, a área técnica da agência impôs à Vibra valor mínimo de multa, que é de R$ 20 mil, já que a ANP não verificou nenhum agravante na pena. Segundo o processo, não foi comprovado que a empresa tenha tido algum ganho econômico com a infração.
Mas o órgão determinou a revogação da autorização para a empresa exercer a revenda varejista de combustíveis, porque a companhia já tinha cometido essa mesma infração no passado, em 2019. Ou seja, houve reincidência da Vibra.
Agora, a decisão da área técnica deve ser submetida à diretoria colegiada da ANP, mas ainda não tem data para o julgamento.
VIBRA DIZ QUE ADULTERAÇÃO PODE TER OCORRIDO NO TRANSPORTE
Em sua defesa, a Vibra argumentou que a empresa coletou uma amostragem do combustível em sua base de operação de Betim, na mesma semana da coleta feita pela ANP, que mostra que o etanol estava com pH 6.3, ou seja, dentro dos critérios exigidos pela agência.
E disse que sua análise é mais fidedigna que os resultados da prova, divulgados somente três meses depois da data da fiscalização.
A Vibra afirma ainda que o transporte do etanol comercializado não foi feito com a estrutura da empresa, mas foi realizado pela modalidade FOB, na qual o posto busca o produto direto da base da distribuidora, não havendo responsabilidade da companhia sobre o fretamento do combustível.
“Há relevante probabilidade de que tenha ocorrido a suposta alteração das propriedades no interior do tanque do caminhão-tanque”, diz a Vibra. “Note-se que a diminuição do pH do etanol hidratado ao ser carregado no caminhão-tanque pode ocorrer pela presença de remanescente de outro produto carregado anteriormente ou até mesmo a presença de água”, completa.
Em nota à reportagem, a comercializadora de combustível diz que “valoriza a excelência e a conformidade dos produtos que distribui”, e afirmou que a jurisprudência da ANP já foi favorável em casos semelhantes envolvendo o caminhão-tanque de terceiros. “Aguardamos a decisão com confiança no recurso apresentado”.
Sobre a reincidência, a Vibra afirma que moveu ação anulatória pendente de trânsito em julgado em relação ao auto de infração anterior, de 2019.
Por fim, a Vibra alega “formalismo exacerbado” com o auto de infração, dizendo que a empresa “sempre atuou em consonância com as diretrizes e normas regulamentares da ANP, bem como sempre cumpriu integralmente as exigências” da agência.
Em sua decisão, porém, a área técnica da ANP rebateu os argumentos da Vibra afirmando que é seu dever aplicar a norma cabível, já que a atividade de polícia administrativa da agência tem por premissa proteger o consumidor e o meio ambiente, além da promoção da livre concorrência e a valorização dos recursos energéticos.
“O entendimento do legislador foi de que a gravidade desse tipo de ilícito é grande, e deve-se assim aplicar-lhe uma pena que iniba a disposição de reincidir e obste a que outros incorram na mesma falta”, diz a agência na decisão.
A ANP também diz que a responsabilidade de garantir a homogeneidade e a especificação do combustível comercializado é do distribuidor, “quando transportados sob sua responsabilidade ou quando armazenados em instalações próprias ou de terceiros sob sua responsabilidade”, conforme a resolução nº 58/2014.
Não está claro no processo a causa de o etanol coletado pela ANP estar fora das especificações de pH estipulados pela legislação na época.
Com relação à reincidência, que resultou na decisão de revogar a autorização da empresa de comercializar combustível, a área técnica da ANP diz que a Vibra possui “em seu desfavor decisão administrativa definitiva que a condenara”.
Nos bastidores, contudo, diretores da agência dizem que, mesmo que a Vibra perca o processo, há uma cautela na aplicação da lei, em vista da relevância da empresa para o mercado de distribuição de combustível. Uma fonte disse à Folha em condição de anonimato que o colegiado pode estudar uma revogação parcial ou gradual da autorização de revenda de combustível da Vibra para que o mercado não seja afetado.
Segundo dados do Instituto Combustível Legal de 2024, a Vibra é responsável hoje por 21,1% da distribuição de combustível no Brasil. Apenas em Betim, que é a maior unidade da empresa, o volume médio diário de vendas está acima de 10 milhões de litros de combustíveis. A média mensal é de 270 milhões de litros, sendo cerca de 380 embarques rodoviários e 1.100 notas fiscais emitidas por dia.
A base é responsável pelo suprimento de combustíveis para os aeroportos de Confins, em Minas, e o de Brasília, para postos revendedores de MG, além de órgãos públicos, como batalhões da Polícia Militar, Polícia Civil e Corpo de Bombeiros da região. O local também comercializa combustíveis para empresas como Vale, CSN, Usiminas, Samarco e Cenibra (Folha, 5/11/24)
Fonte brasilagro.com.br