O Policial Rodoviário Federal, Tércio Baggio, aborda um tema que incomoda muita gente do trecho: controle de velocidade de veículos pesados. Existem meios para evitar que abusos ocorram e que a impunidade seja quase rotina. Baggio coloca o dedo na ferida, com o único objetivo de preservar vidas.
A proposta de Baggio, tese que o Estradas.com.br apoia há 20 anos, é a possibilidade de usar a velocidade registrada pelo cronotacógrafo (a caixa preta do setor de transportes) para punir os infratores que colocam vidas em risco, transportando dezenas de toneladas nos veículos de carga. A mesma tese pode ser usada para o transporte rodoviário de passageiros.
Leia com atenção e compreenda mais como esta mudança no controle de velocidade pode impactar positivamente a segurança rodoviária. A contribuição de Baggio é ainda mais relevante porque vive a realidade e conhece as consequências das tragédias causadas por condutores irresponsáveis.
Crimes intocáveis por Tércio Baggio*
A imagem acima mostra a velocidade máxima atingida por um veículo que na BR 163 em Campo Grande: Atingiu 147 Km\h em algum momento anterior à abordagem.
“Nem é tanto”, alguém poderia dizer. A PRF já fez flagrantes de velocidades acima de 200 Km\h. Verdade. Só que o detalhe aqui: Não se trata da velocidade de UM veículo, mas sim de QUATRO, unidos num conjunto que se denomina popularmente por rodotrem.
A foto é do equipamento “tacógrafo”, que faz o registro inalterável da velocidade desenvolvida, em função do tempo, por todo o conjunto. Uma espécie de caixa preta do grupo de veículos composto por caminhão trator, dois reboques e uma dolly ( plataforma veicular para ligação de reboques).
O conjunto transporta cargas de 50 toneladas e o peso bruto total (carga + veículo) atinge 74 toneladas. Isso, claro, presumindo que não esteja em excesso de peso. (infração bem comum de se observar quando se dispõe de uma balança para fiscalização).
Para se ter uma ideia do que representa isso, um avião comercial Airbus A320, pousa com peso semelhante, e precisa de 1,5 km para parar. É certo que a velocidade da aeronave é bem maior, durante o pouso (cerca de 250 km/h), mas tem a seu favor freios feitos para suportar altíssimas temperaturas e o apoio de resistência de reversos e outras estruturas aerodinâmicas que lhe permitem parar nessa distância.
Se considerarmos as necessidades aqui do trânsito e de nossas rodovias, raramente há mais de 100 metros pra sair de uma situação surpresa que apareça à frente.
Conversando e mostrando essa imagem para outros bons motoristas de rodotrem que também foram abordados (exibindo tacógrafos com registro de velocidade dentro do permitido) foram taxativoz quanto a possibilidade de parar nesse velocidade.
-“Não tem como parar nessa velocidade. Impossível, Ficará dependendo de enormes distâncias na qual o freio possa esfriar”, disse um deles.
Então, assim estamos: Dirigindo nossos veículos de passeio contra “Airbus A320s” que não podem parar.
E qual seria a solução para algo tão grave? Um caminho viável, seria alterar a legislação para permitir a multa de velocidade baseada no tacógrafo, afinal, é um equipamento universalmente utilizado e conta com obrigação de ser aferido pelo Inmetro a cada 2 anos.
E sobre os radares? Já não temos um equipamento para esse fim de aferir velocidades? Bem. Posso dizer que são bem pouco eficientes para aferir velocidade de caminhões, pois seus motoristas possuem uma forte rede de informação composta de rádios PX , aplicativos, além da famosa infração de “sinais de luz pra avisar da fiscalização” para escapar da punição.
Em qualquer país sério, motorista de caminhão com essa velocidade sentaria na frente de um juiz e teria sua CNH suspensa ou caçada de forma célere. No Brasil, a PRF vê a infração e libera sem poder fazer algo concreto, a não ser, claro, quando ele já causou o acidente e o tacógrafo evolui, de mero registro, para prova criminal em um homicídio no trânsito que não se conseguiu evitar em fiscalização.
No Brasil é assim. A tragédia é anunciada aos quatro ventos, mas só se faz algo após sua materialização.
(*) Tercio Baggio é policial rodoviário federal há 24 anos e atua no Mato Grosso do Sul