Até 2045 a Alemanha pretende alcançar neutralidade de emissão de gases-estufa, renunciando ao petróleo, gás natural e carvão mineral, com maior eficiência energética e empregando mais fontes renováveis. Um papel central cabe ao hidrogênio (H2).
Esse gás extremamente volátil é obtido separando-o por eletrólise do oxigênio da água. Nesse processo atualmente se emprega sobretudo energia proveniente de gás natural, mas se este é substituído por eletricidade de fontes verdes, o hidrogênio é climaticamente neutro.
Trata-se de uma alternativa especialmente importante onde a descarbonização é difícil ou impossível. Segundo especialistas, a siderurgia é o setor em que a introdução do hidrogênio verde trará maior redução do dióxido de carbono, mas ele também será relevante na indústria química e de cimento, e nos transportes rodoviário pesado e de longa distância, aéreo e náutico.
Para impulsionar a criação de uma infraestrutura para o hidrogênio, em 2020 o então governo de Angela Merkel estabeleceu a Estratégia Nacional para o Hidrogênio (NWS, na sigla em alemão), que o governo vigente acaba de atualizar. Decidiu-se, por exemplo, que no futuro o gás também será empregado no tráfego e na calefação de edifícios.
Isso eleva grandemente a demanda previsível, contando-se com 95 a 130 terawatts/hora em 2030. Um estudo atual do Centro Marítimo Alemão prevê que, até meados do século, apenas a conversão dos atuais 1.700 navios da frota de alto mar nacional ao hidrogênio vá exigir 120 terawatts/hora.
Países africanos e Brasil como exportadores de hidrogênio
A Alemanha não tem meios de produzir o volume necessário de hidrogênio: “pelo menos de 50% a 70% terá que ser importado”, afirma o secretário de Estado no Ministério de Cooperação Econômica, Jochen Flasbarth, e diversos países são exportadores potenciais.
“Ao contrário do mundo fóssil, a indústria do hidrogênio tem uma gama muito grande de possíveis países fornecedores: é todo o cinturão solar do planeta, regiões com grande potencial de energia hídrica, também fotovoltaica e eólica.”
No âmbito de sua cooperação para o desenvolvimento, a Alemanha já apoia o estabelecimento de uma indústria de H2 no Brasil, África do Sul, Argélia, Marrocos, Namíbia e Tunísia. Do projeto também participam empresas de outros países europeus, em sinergia com firmas locais.
O Brasil vai virar uma potência global do hidrogênio verde?
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No Marrocos, está prevista para 2026 a entrada em funcionamento da primeira grande central de referência de hidrogênio verde do continente africano. Na Namíbia, o Ministério alemão da Economia promove a ampliação da energia eólica; enquanto o de Cooperação para o Desenvolvimento apoia com projetos urbanísticos relacionados às fábricas planejadas e com a formação de mão de obra.
“Orientamos a nossa política para a indústria mundial do hidrogênio”, com 270 milhões de euros disponíveis para incentivar investimentos nas nações parceiras, explica Flasbarth. “Partimos do princípio de que assim vamos dar a partida a algo mais do que 1,3 bilhões de euros em investimentos. Ou seja, trata-se de uma noção realmente moderna de política de desenvolvimento, em que empregamos dinheiro público a fim de direcionar recursos privados para tecnologias transformativas.”
De olho nos direitos humanos e padrões ambientais
No entanto a Estratégia para o Hidrogênio não tem apenas significado nacional para a Alemanha: “A meu ver, a indústria do hidrogênio será a espinha dorsal da economia mundial neste século, e tem o potencial de resultar numa economia inclusiva, mais justa do que o mundo fóssil jamais foi, com seus poucos fornecedores e fortes estruturas de dependência.”
Para tal, contudo, será preciso respeitar padrões “nos direitos trabalhistas, direitos humanos e normas ambientais”, enfatiza o secretário de Estado. Ficam excluídas parceria com países que apostam no carvão como fonte energética ou que sofrem escassez de energia
“Do ponto de vista da política de desenvolvimento e ético, não faz o menor sentido importarmos hidrogênio de países em que muitos não têm acesso a energia, à eletricidade. Só para dar uma ideia da ordem de grandeza: no momento, 600 milhões carecem de acesso à energia elétrica na África subsariana.”
Para se produzir hidrogênio verde é necessário, além de eletricidade, muita água. “Especialmente nos países que dependem da dessalinização da água do mar, isso implica não pensarmos só na demanda hídrica para a produção do gás, mas, por exemplo, para também abastecer a cidade mais próxima com água potável.”
Indústria do hidrogênio também gera empregos
Via de regra, o hidrogênio produzido fora da Europa terá que ser transportado por via marítima. Os navios poderão descarregar nos terminais atualmente utilizados para gás natural liquefeito na Europa. Porém, como o gás é extremamente volátil, ele terá antes que ser convertido em derivados como amoníaco ou metanol, cuja produção também exige a criação de possibilidades nos países parceiros.
Para a distribuição de H2 in loco, em princípio a rede de gás natural existente é utilizável mas só após uma adaptação. A Estratégia Nacional prevê a construção, até 2027/2028, de uma “rede inicial de hidrogênio” na Alemanha, com mais de 1.800 quilômetros de tubulações novas ou adaptadas. Em nível europeu, somam-se mais 4.500 quilômetros. Até 2030, “todos os centros de produção, importação e armazenamento estarão conectados com os consumidores relevantes”.
Grande parte da tecnologia necessária a essa infraestrutura virá da Alemanha, cujos engenheiros de máquinas e firmas de eletrônica fazem parte da elite internacional do setor. Só a multinacional Bosch investirá nos próximos três anos 2,5 bilhões de euros nesse campo.
Serão fabricados em especial eletrolisadores e compressores para o transporte nos gasodutos e postos de abastecimento, além de células combustíveis em que a energia acumulada no hidrogênio é convertida em eletricidade. A multinacional estima que já em 2030 um quinto dos veículos utilitários pesados estará equipado com um motor apropriado.
Todo esse empreendimento também garante na Alemanha postos de trabalho que se tornarão dispensáveis em outras áreas. Para a fabricação de motores elétricos, por exemplo, se precisará de apenas 10% do número de operários atualmente empregados na indústria de motores de combustão.