As vendas externas de petróleo do Brasil bateram recorde em março, justamente quando passou a vigorar um imposto de exportação sobre a commodity anunciado repentinamente pelo governo, sem que as petroleiras tivessem margem de manobra para reposicionar embarques, apontaram dados governamentais e especialistas.
No acumulado deste mês até o dia 24, o volume de petróleo exportado do Brasil somou 9,4 milhões de toneladas, alta de 75,4% ante março inteiro em 2022, segundo a Secretaria de Comércio Exterior (Secex), o que deverá contribuir com um aumento da arrecadação da União.
O aumento acontece após meses de produção de petróleo no Brasil nos maiores patamares já registrados, enquanto a demanda nas refinarias brasileiras foi fraca, pelo menos em janeiro, segundo dados oficiais.
O novo imposto sobre o petróleo exportado, de 9,2% e que terá duração de quatro meses, foi anunciado pelo governo em 28 de fevereiro, um dia antes de começar a ser cobrado em 1º de março, de forma a compensar a decisão da União de manter parcialmente uma desoneração de impostos sobre combustíveis.
O tributo foi criado por medida provisória e tem sido alvo de questionamentos de petroleiras, especialistas e partidos políticos, que chegaram a recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para contestá-lo.
“Apesar de ter esse imposto a mais na exportação, já havia contratos (para exportação), o calendário de ‘lifting’ (retiradas de petróleo por petroleiras em alto-mar) já havia sido acertado para cada campo, não tinha como mudar”, afirmou à Reuters o diretor de pesquisa em exploração e produção da Wood Mackenzie, Marcelo de Assis.
Em grandes campos brasileiros marítimos, onde há a presença de petroleiras além da Petrobras, é comum que as concessionárias se revezem para retirar o petróleo a que tem direito em alto-mar toda vez que os tanques das plataformas do ativo em questão se enchem. Esse calendário é combinado com antecedência, o que, diante do novo imposto, pode indicar que uma petroleira tenha sido mais afetada do que outra pela taxa de exportação neste momento.
“Quando acerta o calendário de lifting, acerta armadores —os navios que vão fazer o ‘lifting’— e fecha a ponta com os compradores. Não é algo que seja possível ter flexibilidade para manter no mercado nacional.”
Assis ressaltou ainda que “fevereiro é um mês curto” e que é possível que algumas cargas tenham ido para março, contribuindo com o recorde.
Em nota à Reuters, o Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP), que representa as petroleiras no Brasil, afirmou que resultado deste mês também foi influenciado por um patamar bem inferior de embarcações em fevereiro, quando o país exportou cerca de 2,5 milhões de toneladas, o volume mais baixo para o mês desde 2015.
Segundo dados citados pelo IBP, o recorde anterior de exportação de petróleo do Brasil havia sido obtido em dezembro de 2019, com 8,5 milhões de toneladas.
O volume total de petróleo exportado pelo Brasil em março será publicado pela Secex na segunda-feira.
Já no primeiro trimestre, as exportações subiram 15% ante o mesmo período de 2022, considerando os dados parciais de março, segundo o IBP, que evitou explicar de forma mais detalhada os motivos para o avanço das exportações.
A Petrobras, maior produtora e refinadora de petróleo do país, por sua vez, declinou pedido de comentários.
BALANÇO DE PRODUÇÃO E DEMANDA
Uma fonte da petroleira pontuou, entretanto, que o volume de exportação apenas acompanha o balanço de produção e demanda das refinarias no Brasil, que é o consumidor natural. “Se houver alguma refinaria em manutenção, ou a demanda de derivados for baixa, o consumo nacional de óleo cai, sobrando mais pra exportar. Se tiver aumento da produção de óleo, idem”, afirmou.
A Petrobras informou anteriormente que iniciaria em 10 de março a maior parada de manutenção já realizada na Refinaria Presidente Bernardes de Cubatão (RPBC), em São Paulo, com duração de 60 dias e investimentos que totalizam 720 milhões de reais.
A produção de petróleo do Brasil bateu recorde em janeiro e registrou o segundo maior volume em fevereiro, segundo os dados mais atuais publicados pela reguladora ANP. Ainda não há dados de março disponíveis. Já as informações sobre o processamento das refinarias em fevereiro e março ainda não foram publicadas.
O analista de Inteligência de Mercado da StoneX, Bruno Cordeiro, ponderou ser necessário aguardar dados mais atuais de produção de petróleo e consumo das refinarias. Mas pontuou que pode ter havido algo semelhante com o registrado no primeiro mês do ano.
“Em janeiro, foi observado um excedente de petróleo disponível para a exportação… a produção cresceu 8% no comparativo com janeiro de 2022, ao passo que o consumo doméstico (de petróleo pelas refinarias) caiu 13,4%”, afirmou.
“Talvez tenhamos um cenário parecido para março… pode ser que a produção tenha continuado aquecida, ao passo que o consumo das refinarias não vingou, criando esse excedente exportável.”
Procurada, a reguladora ANP informou que não comentaria a reportagem, uma vez que ainda não dispunha de dados consolidados da Secex relativos a março.
Fonte Uol